Quem nunca teve a sensação de “frio na barriga” em um dia de ansiedade? Muito além de um tubo digestivo por onde a comida passa e os nutrientes são absorvidos, o intestino e seu papel na saúde humana tem sido objeto de diversos estudos nas últimas décadas, e hoje ele é reconhecido como um “órgão inteligente” ou “segundo cérebro”.
A importância do intestino na manutenção da saúde tem sido reconhecida há muito tempo – já dizia Hipócrates, o pai da medicina ocidental, nos anos 400 a.C. que “a má digestão é a raiz de todo mal”. A medicina tradicional chinesa, desenvolvida ao longo de milhares de anos, também relaciona o intestino com a saúde da pele e a regulação do humor.
Mas o que será que o intestino tem de tão fascinante para ser considerado nosso segundo cérebro?
A começar pelo seu tamanho: se abríssemos e esticássemos suas duas partes – o intestino delgado e o grosso – o intestino teria a área estimada de uma quadra de tênis, cerca de 200 m²! Essa enorme superfície serve como habitat de trilhões de bactérias, que compõe a chamada microbiota intestinal. Nossa pele, o trato urinário e o respiratório também são colonizados por microrganismos, mas o gastrointestinal é sem sombra de dúvida o mais habitado. Sozinho o cólon, a maior porção do intestino grosso, contém cerca de 70% de todas as bactérias do corpo humano. O número total de células bacterianas no intestino supera em cerca de 10 vezes o número de células que compõem o nosso corpo! São 1014 células de bactérias convivendo pacificamente no TGI, utilizando dos nutrientes dos alimentos que ingerimos para sobreviver.
A colonização do nosso intestino começa imediatamente após o nascimento e vai se modificando e se adaptando de acordo com os fatores genéticos, o ambiente e a alimentação. Um terço das 1.000 diferentes espécies de bactérias é comum a todas as pessoas, mas os outros dois terços são específicos de cada indivíduo, isto é, a nossa microbiota pode funcionar como um documento de identidade. E embora cada microbiota seja única, elas sempre têm as mesmas funções fisiológicas que impactam diretamente a nossa saúde, dentre elas a produção de algumas vitaminas (B e K), a barreira física a patógenos, a imunomodulação, e a mais conhecida dentre suas funções: a digestão dos alimentos.
Digestão dos Alimentos
Uma vez que o alimento chega ao trato gastrointestinal, é preciso quebra-lo, absorver seus nutrientes e expelir os restos, o que requere uma série de processos químicos, mecânicos e contrações musculares rítmicas que movam todo o bolo alimentar e fecal até a saída. Para isso, além dos microrganismos, o intestino conta com cerca de 100 milhões de neurônios próprios, que podem, inclusive, controlar os movimentos intestinais independentemente do comando cerebral. Dá para entender a razão do apelido de “segundo cérebro”? Tal qual o cérebro o intestino também pensa, decide e executa tarefas. Além disso, o sistema nervoso entérico, como é chamada essa rede neuronal do intestino, também é responsável pela produção de 90 a 95% da serotonina do corpo, um neurotransmissor de bem-estar.
Alterações no Intestino
As alterações na microbiota (a disbiose) e nos neurônios intestinais tem sido ligada a diversos distúrbios: desde osteoporose em ratos pós-menopausa, a autismo em crianças, doença de Parkinson, Alzheimer, até a Síndrome do Intestino Irritável, que afeta milhões de pessoas. Mas a verdade é que essa conexão entre doenças e as lesões no sistema nervoso entérico ainda são pouco conhecidas pela ciência, e não se sabe o que é causa ou efeito.
A notícia, por ora, é que é possível sim prevenir ou até reverter os desequilíbrios na microbiota intestinal através da nossa alimentação. O que comemos é peça chave na manutenção da diversidade e funcionamento da nossa microbiota. Alimentos ricos em fibras como frutas, verduras, legumes, cereais integrais e castanhas – chamados prebióticos – são essenciais para nutrir bactérias benéficas; e alguns iogurtes e leites fermentados também podem contribuir para manutenção da microbiota, pois são fonte de microrganismos benéficos – chamados probióticos. E as bactérias que habitam o nosso segundo cérebro, por usa vez, agradecem devolvendo inúmeros benefícios ao nosso corpo. 🙂